Sunday, July 27, 2008

Se nao falar, nao existe

Não ouço falar sobre o assunto, logo ele não existe. Trata-se de uma realidade tanto para pequenas, como para grandes questões. Houve um tempo em que a imprensa pegou no pé das empresas que contratavam crianças para trabalhar. Reportagens no Fantástico, no Jornal Nacional, e em programas de grande audiência. O ar de vergonha que se dava ao tema deixava uma mancha entre os empregadores abusivos. Porém, há números que comprovam que quando a imprensa deixou de dar essa ênfase, o trabalho infantil voltou a crescer.

Em 1995, 18,7% da população entre 10 e 14 anos trabalhava. Esse número despencou para 6,6% em 2000, mas voltou a crescer e chegou a 10,1%, em 2004. São dados do Relatório Nacional sobre Direitos Humanos no Brasil, organizado pelo Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV-USP) e pela Comissão Teotônio Vilela.

O tema novamente ganha força com a temática da sustentabilidade. Mas não se trata apenas do trabalho infantil. Mas da falta de escolaridade, da falta de esgoto, da falta de ética nas relações.

Dez anos atrás li que o dinheiro destinado à educação no Brasil equivalia, proporcionalmente, ao montante dedicado ao assunto em países como Canadá. Porém, aqui o dinheiro não chega a quem precisa. Se perde na falta de controle, no ralo da corrupção, da anestesia brasileira.

E assim vamos, deixando de falar ou de nos indignar pelo que é chocante, e assim esses assuntos não existem. Não para nós que temos acesso a internet, que fazemos MBAs, que rodamos o mundo. Não falamos, não existe. Somente nos lembramos e ficamos putos quando vamos à Europa e os europeus nos questionam. Como deixamos isso acontecer? Aí dói. Adoro pessoas que dizem nao suportar o Brasil e o comparam aos países desenvolvidos. Não lembram que o estágio evoluído lá de fora se deve à indignação dos espanhóis, dos franceses, dos japoneses, etc, etc, que saem à rua e tomam as rédeas da situação quando podem.

Uma empresa de telefonia, contava um amigo que mora na França, aumentou o valor da tarifa telefônica. Pois a população toda entrou em acordo de que entre tal e tal hora não usariam o telefone. Foram duas horas de silêncio voluntário, em protesto a tal aumento. A empresa, claro, voltou atrás.

A vida pode ser um pouco melhor, estou certa. Está tudo aí, é só pegar.

Thursday, July 10, 2008

Dantas e os dólares nas ceroulas... os rotos e os rasgados

Tem gente que acredita piamente que a corrupção no Brasil começou com o Lula no poder. A partir de qualquer ponto de vista, qualquer tipo de corrupção com verba pública é indefensável. Mas me faz rir quando se imagina que o país passou a ser usurpado ali com os waldomirosdiniz ou os dólares na cueca. A diferença entre o atual governo e o anterior é a sofisticação do ofício. De fato, o PT é "rastaqüera" em algumas negociatas.

Mas foi sob as barbas do governo anterior que surgiram esquemas complexos e inteligentes como o que está sendo descoberto agora, do empresário Daniel Dantas. Que, diga-se de passagem, é um dos caras mais brilhantes que eu já vi.

Cobri telecomunicações por bons anos na efervecência do assunto, então tive contato com as empresas dele. Muito ousadas e interessantes, saindo na frente em inovações.

Dantas foi uma salvação para os tempos de privatização da Telebrás, em 1998. Haviam poucos interessados em comprar os ativos, pois as grandes mundiais já tinham feito movimentos de consolidação em países europeus. E o governo esperava arrecadar mais que o valor inicial, afinal de contas, era um leilão, e o dinheiro iria para o governo, que tinha lastros de juros exorbitantes por conta de suas dívidas.

Ele salvou a lavoura ao se unir aos fundos de pensão que poderiam ali capitalizar seus recursos. Mas Dantas era o mais inteligente das aulas de Mario Henrique Simonsen, segundo as palavras do próprio. Sempre foi de intrigar o desenho societário das suas empresas, uma verdadeira árvore genealógica com diferentes variações, em que em um momento a família Dantas tinha pouca participação e logo em seguida, tinha controle quase total do ativo, quase anulando o poder do outro sócio que estava par a par no início.

Lembro de ter feito uma reportagem pelo Estado de S. Paulo sobre as empresas dele , em que ouvi seus sócios do fundo de pensão e um alto executivo do grupo Opportunity. A fonte nao falava comigo, gritava, nem mesmo meu estado de gestante o fez mudar de tom.

O Opportunity é muito interessante. Eles sabiam que o Estadão daria uma matéria enorme na segunda. No mesmo dia, Daniel Dantas deu uma entrevista para o Valor dizendo que tinha interesse em comprar a Vésper, uma empresa de São Paulo, que não tinha para quando ser vendida. Claro que a pauta da imprensa toda correu atrás da informação do Opportuniy. Era um blefe, soube-se depois. Os leitores comuns não fazem idéia da inteligência das assessorias de imprensa para focar onde é preciso.

Vale lembrar, contudo, que nessa reportagem ouvi os dois lados, ou seja, o Opportuniy e os fundos de pensão, na eterna busca da isenção. Pouco tempo atrás, minha fonte dos fundos de pensão estava envolvido em operações suspeitas, ou seja, me parece que era um roto falando de um rasgado, ambos com telhado de vidro.


E a fonte que gritou comigo? Também estava entre os presos da Polícia Federal.

Friday, July 04, 2008

a gente nao quer só...


O shopping construído aqui perto de casa foi recém inaugurado. E estava feliz por contar com um belo complexo de cinemas. Semana passada estava sossegado e me iludi que continuaria sempre assim, oculto do grande público.


Pois a fila nos caixas da praça de alimentaçao hoje me fez acordar rapidinho dessa ilusao. E me fez pensar no filme que assisti na semana passada, que projeta uma humanidade totalmente obesa.


Tem aquela expressão que os executivos adoram usar para avançar nas estratégias de mercado. O tal de share of pocket, algo como uma parte do bolso, bolso este do consumidor, que deve estar, segundo a expressão, recheado de dinheiros. Pois todo segmento da economia tenta trabalhar para fidelizar parte desse share of pocket. Nesse sentido, a indústria de alimentos foi muito eficiente. Massificou o prazer de comer. E massificou assim também a idéia de que este é um prazer e outros, como um passeio no parque, ou teatro, ou qualquer outra atividade, não vale tanto a pena, ou não desperta tanto prazer. Ou é caro. Ou é perigoso.


Para se ter uma idéia do que significa o share of pocket, a tecnologia, por exemplo, ocupou um amplo espaço nos nossos bolsos sem que percebêssemos. TV a cabo, internet, celular. Quanto do seu orçamento mensal vai com estes itens? Acredite, você espaçou suas visitas ao dentista, você deixou de fazer outras coisas - talvez ir ao cinema - porque a tecnologia passou a dominar parte do seu bolso.


Tudo em exagero faz mal. Nem virarmos nerds e escondidos do mundo real com muita tecnologia, nem obesos por comer demais.


O brasileiro aumentou de peso, com uma média muito acima do que há dez anos, e ninguém percebeu. quer dizer, a indústria de remédios para emagrecer percebeu. Tanto assim que hoje somos campeões na venda de remédios para perder peso.


Uma volta por Nova York dá uma idéia de para onde vamos. Lá, é o mundo dos obesos. Uma obesidade muito estranha, flácida até a alma, estrias gigantes nos braços, pernas e coxas deformadas. Se aumentamos de peso em dez anos sem darnos conta, imagine o que será nos próximos. talvez devamos preparar-nos para os cremes anti estrias nos braços - siiiim, estria mesmo, daquelas enormes, que criam sulcos na pele.


Um endócrino brasileiro que se especializou no estudo de enzimas para ajudar a reduzir a obesidade, não encontrou literatura relativa ao assunto nos EUA pois, segundo ele, a indústria de alimentos lá foi mais forte para inibir essa cultura. Náo sei até que ponto é verdade. Mas quando vejo aqueles potes gigantes de pipoca, tão american way of life, que limaram nossos simpáticos e ingênuos pipoqueiros, que vendiam talvez um quinto do que vem naqueles potes plásticos, em baratas embalagens de papel, me ponho a pensar que de fato, a indústria de alimentos pode atropelar algumas culturas. E a pipoca, veja só, é grande fonte de renda das indústrias de cinema.